Filme “Titanic – somente Deus por testemunha” e doutrina de Epicuro
Filme
“Titanic – somente Deus por testemunha” e doutrina de Epicuro
Vi
o filme antigo do Titanic e fiquei impressionado com a qualidade e o
foco histórico da obra, que diferente do de Cameron, não se focava
em história de amor ou em temas diversos do personagem principal: o
navio. O filme tem ritmo de quase documentário e mostra bem fatos
relatados por sobreviventes, que apesar do dinheiro, tiveram a lição
da catástrofe para repensar seu entendimento existencial. Vê-se em
umas pessoas, a proximidade do naufrágio e sua imperturbabilidade
(ataraxia), o que nos lembra a doutrina de Epicuro, filósofo da ilha
de Samos. Essa ausência de dor nos leva a pensar de como algumas
pessoas conseguem suportar certos acidentes, ou situações extremas.
Também nos mostra que a riqueza não parece o maior prazer, e que
esse prazer tem de ser moderado.
O
navio Titanic carrega em sua história uma complexidade
desconfortante. Primeiro que uma pessoa disse que nem Deus afundaria
o navio, em uma opinião mais que controvertida. Depois o nome
Titanic soma 13, número de azar e que já esteve ligado a diversas
catástrofes e pessoas, um deles Napoleão. Mas voltando ao filme,
esse explora temas que foram repetidos no filme atual, e que naquele
tempo desse, década de 50, era mais feito com talento e maquetes. O
navio afunda por inteiro, mas é desafiante a cena final, mesmo
aquele momento posterior ao naufrágio. Vemos também que por
telégrafo já estava avisado sobre o gelo, e que aquela rota era
mais que perigosa no momento. Também percebemos que a preguiça
humana de um capitão de navio que estava próximo fez com que a
tragédia fosse inevitável, haja vista dormir e não dar bola a
fogos sinalizadores do navio inglês.
Mostra
assim o filme a efemeridade da condição humana, e os prazeres vãos
em prol da desgraça alheia. Assim a divisão de classe não tornou o
navio um “castigo” contra ricos somente, mas uma lição de
sobrevivência, uma vez que dos 1500 passageiros, 700 sobreviveram, e
que levaram consigo essa suma experiência de vida. Disso observamos
essa obra de arte de 1958 ficou assim gravada, lembrando o desespero
de uns, e a imperturbabilidade de outros. Isso que impressiona. Como
uma banda continua tocando enquanto um navio afunda? E até onde a
honra de um capitão vai a fim de que esse afunde junto a seu navio,
lutando até ao fim em manter-se de pé? Recentemente notamos o
padrão ético de nosso tempo, quando um capitão fugiu do Costa
Concórdia, sem nenhuma espécie de arrependimento ou maior dúvida.
Mas a imperturbabilidade nesse filme foi mostrada nas pessoas que
estavam nos botes, bem como em casais e famílias que se mantiveram
hora na proa, hora na polpa do navio, procurando refúgio naquele
carma coletivo que traçava o seu destino.
A
doutrina de Epicuro ensina a sabedoria. Não que negue os prazeres da
vida, mas que os tenha com moderação. E valoriza mais uma amizade e
o autoconhecimento, do que superficiais riquezas e famas. Em nosso
tempo já vemos pelo contrário, além de certo luxo, presenciamos um
total vazio das pessoas. Fosse hoje, ficariam apáticas e se matariam
pelos botes, sem qualquer seleção de proteger as crianças ou
pessoas mais velhas. Vemos que o navio social afunda, e que cada vez
mais ficamos imperturbáveis com a violência, aceitando a cada dia
mais a desgraça alheia, numa desumanidade construída pelos meios
de comunicação de massa. Semelhante a Hindemburg, o famoso Zepelin
que despencou do céu, o Titanic nos deu a lição histórica de que
não se desafia a natureza ou Deus, e que o respeito para com todos é
essencial a manutenção de alguma estabilidade material ou do
espírito. Vemos em Epicuro a amizade muito valorizada também, essa
tão lembrada na obra de Alain de Botton. Fato é que o filme mostra
as coisas de um modo diferente, e que nos leva a uma obra menos
sensacionalista do fato, mais realista e crível, apesar de que o
navio não se parte no final, fato que foi descoberto depois a
ocorrência. Mas o detalhe da chaminé quebrando, foi de arrepiar.
Mesmo assim um grande filme e que deve ser visto por todo cinéfilo
ou admirador da história.
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