Filme A Partida e o ser para o nada
Filme
A Partida e o ser para o nada
O
filósofo Jean Paul Sartre disse que o ser é destinado para o nada.
De certo modo ficamos sempre assustados com a ideia que deixaremos um
dia de existir. Esse impasse existencial nos faz muitas vezes se
arrepender por não termos vivido ou aproveitado coisas da vida, mas
ao mesmo tempo nos leva a uma dimensão espiritual, ou mística que
faz superar o momento final. Vendo um filme maravilhoso de produção
japonesa, A partida, vencedor de Óscar, percebi que talvez a própria
transição ou morte possa já ser uma grande lição, além de se
perder o ente querido, mas a morte que nos envolve, as células que
se vão, os alimentos que ingerimos e assim por diante. A vida é uma
dialética entre nascimento e morte, e sabemos que o fim será uma
certeza. Mesmo por morar em frente a cemitério, e acompanhar todos
os dias ou quase cerimônias fúnebres, percebo que isso nos leva a
compreensão maior do momento, sem aquele “desespero humano”, a
sombra de Kierkegaard e seu pai. Nessa produção japonesa também o
tema da morte e da relação com o pai são centrais, me levando a
esse momento existencialista.
Adoro
filmes japoneses. Acho que a qualidade e o foco em detalhes
impressiona, e mesmo a cosmovisão é diferente. A certeza com
relação ao respeito a tradição é algo bem diferente do que aqui
no ocidente e Europa, onde a tradição já se foi faz tempo. Vejo
nos rituais funerais de lá uma sensibilidade muito singular, e essa
passagem de dimensão ou mudança de corpo se faz de forma mais leve.
No filme A Partida mostra por outro lado o tabu que se deve ser na
profissão de agente funerário, uma vez que esse músico de
violoncelo ao se ver desempregado, procura às cegas o emprego e acha
esse serviço que ninguém quer. Ganha muito dinheiro e satisfaz a
esposa, escondendo sua real atividade. Ele se transforma e apesar de
antes nunca ter visto uma pessoa morta, acaba por ter um contato
muito singular com as família e pessoas, uma dimensão super-humana
de tratamento, o que antes não possuía. Mas amigos se afastaram e a
esposa se separou, haja vista não ser “bem visto” alguém que
toca em mortos lá nas terras nipônicas.
Fato
é que me impressionou é a história moderna, do pai que se separa
da esposa e nunca mais vê o filho. O filho se torna agente funerário
e por fim conhece seu pai apenas no momento de sua morte, fazendo
inclusive seu velório. Isso demonstra uma compreensão bem elevada
do complexo de Édipo e nos leva a pensar em outro grande personagem
da história, em filósofo Kierkegaard, fundador do existencialismo,
escola da qual mais conhecemos Nietzsche. A existência é um desafio
e vemos que o ser para a morte foi uma paradigma moderno, e mesmo nas
artes e na música vemos esse tema ser mais relevante. Nas músicas
dos anos 80, seja em Legião Urbana, ou mesmo em um Smiths, vemos o
tema da morte e da fatalidade, mesmo o ar melancólico de algumas
composições, uma forma de espelhar esse momento existencialista.
Vemos
que o Ser é mesmo um encontro com Deus, e que quando estamos nesse
“nada” é que podemos conhecer a plenitude da luz. O filme A
partida não foi de modo algum espiritualista, mas mostrou vários
funerais de diversas religiões, e de forma artística suavizou o
momento que é tido por muitos como o máximo de tristeza ou
indignação. O protagonista parece frio, mas o filme leva uma
emotividade que está cada vez mais difícil percebermos em nosso
momento pós-moderno, cheio de tecnologias e velocidade de informação
por redes sociais. Fato é que a gravidez da esposa do agente
funerário culminou na vida nova que nasce, em contraste com o perdão
em relação ao seu pai e com a tradição da carta-pedra, que o
mesmo continuou, uma vez que sabe partilhar dos genes do seu
ancestral. Vemos justamente na existência par o nada da morte uma
forma de valorizar o todo da vida, e aprender a ver o lado bom das
coisas, mesmo que por momentos ruins. A partida venceu porque mostrou
um aspecto sui generis, raro no cinema contemporâneo. E o Japão
ressurge com antigos saberes, nos mostrando o oriente e a luz maior.
Muito bom seu texto, pois retrata a vivencia da nossa vida diária, o que somos e pra onde vamos, nascemos do nada e durante a nossa trajetória social, criamos caminhos pro bem e pro mal, só cultivamos o que semeamos, me chamou atenção o pai abandonou a família e seu filho teve contato com ele o ultimo numa funerária. Bela reflexão! Pra me é maravilhoso ler você suas ideias brilhante.
ResponderExcluirAdoro esse filme!!!
ResponderExcluirTatiana Pastorini
Esse filme eu tinha guardado e esperava bem menos. Fiquei impresionado e tê-lo comprado foi mesmo um bom investimento. Acho que existe um mundo diferente no cinema oriental. abraço pra vcs e voltem sempre
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